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Começar de novo em Berlim

Experiência de trabalho estimulante fora de Portugal, melhores oportunidades de emprego e carreira, salário mais alto ou curiosidade pelo estilo de vida da cidade são algumas razões que contribuem para a busca de uma nova vida em Berlim. Quais os desafios que encontram?

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Fotos: © Luis Bompastor

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Rita Guerreiro

Licenciada em Audiovisual e Multimedia pela ESCS – Escola Superior de Comunicação Social (Lisboa), participou em vários projectos de voluntariado na cidade e iniciou o Shortcutz Berlin em 2011 com Humberto Rocha, Juntou-se à nova equipa Berlinda em 2016 e é desde então editora do magazine, para o qual contribui com vários artigos e entrevistas.

A capital alemã continua a ser um chamariz para milhares de jovens dos quatro cantos do mundo, mas nem tudo são rosas: apesar de ser uma cidade multicultural e aberta, o desconhecimento da língua e a adaptação à mentalidade e estilo de vida alemães podem ser uma barreira à integração.

EXPETATIVAS E OPORTUNIDADES

Com 21 anos, Carolina Silva chegou a Berlim a 26 de agosto de 2014 e começou a trabalhar numa empresa de e-commerce uma semana depois. Não foi a crise que a motivou, mas a vontade de conhecer o mercado de trabalho de um outro país. “Quando acabei a licenciatura em Jornalismo queria ter uma experiência de trabalho internacional e candidatei-me a uma série de estágios em países diferentes. Na altura fiz entrevista para a empresa mas não fiquei com a vaga. Entretanto arranjei trabalho na minha área em Coimbra, mas era um contrato temporário como freelancer e a dois meses do fim contactei novamente a empresa e fiquei com um novo estágio”. Poucos meses depois, conseguiu um contrato de dois anos no departamento de Marketing.

 

Engenheiro informático, João Xavier foi para Berlim trabalhar como Game Developer em agosto de 2013. Natural do Porto, fez Erasmus em Toulouse em 2010 e viveu e trabalhou em Lisboa, mas após dois anos sentiu alguma estagnação profissional e decidiu mudar. “Queria trabalhar em jogos. Queria sair de Portugal, fazer um trabalho diferente e do qual eu gostasse”, lembra. Recebeu propostas aliciantes do estrangeiro – uma em Hamburgo, onde chegou a ir a uma entrevista. Depois, uma oportunidade em Berlim. “Fui a uma entrevista mas não estava a contar que fosse resultar porque não tinha muita experiência em jogos.”, conta. Mudou-se para Berlim com uma oferta salarial duas vezes superior ao que ganhava em Portugal.

BARREIRA DA LÍNGUA E INTEGRAÇÃO

A empresa ajudou-o com a mudança de país - procurar casa, fazer o registo na cidade, abrir conta no banco. Quando não se fala a língua, facilita muito o processo. João alerta “Na Alemanha, o inglês não ajuda propriamente. Em comparação com os países nórdicos, o nível de inglês deixa a desejar. Por isso, a qualquer pessoa que pense vir para a Alemanha, recomendo que antes aprenda alemão”. Nunca se sentiu desvalorizado no trabalho por não falar alemão ao princípio, mas lembra o desconforto que era estar num ambiente social sem falar a língua, estar em convívio com alemães e não conseguir acompanhar nem participar na conversa.

 

No início, recorreu à ajuda de amigos com mais conhecimentos da língua para simples tarefas, como escolher uma operadora de internet. “Estar dependente de outros para poder resolver esse tipo de coisas não é ideal. Quando consegues fazê-lo sozinho, sentes-te muito mais realizado e independente”, conclui. Reconhece que não é necessário falar alemão para viver em Berlim, mas considera que só assim se consegue uma verdadeira integração na cidade. Sentiu também alguma diferença de mentalidade em termos laborais: “Os alemães são pessoas mais especializadas e, se forem contratados para fazer um determinado trabalho, só fazem esse trabalho. Não “dão um jeitinho” ou ajuda noutra tarefa que não seja a deles. São menos flexíveis”.

 

Para Carolina, a barreira da língua impôs-se menos “A cidade é muito internacional e o inglês é suficiente para a grande maioria das situações do quotidiano, pelo menos ao princípio”. A grande diferença que sentiu foi nas pessoas “Acho que são, no geral, muitíssimo mais afáveis e prestáveis em Portugal”. Refere ainda que a ideia da eficiência alemã é quase um mito, que se nota no dia a dia na cidade, especialmente no atendimento ao público: “Os portugueses podem ser tão eficientes quanto os alemães, e ainda o fazem com um sorriso na cara, ou um mínimo de amabilidade. Seja em repartições públicas ou no comércio em geral”.

APRENDER E RECOMEÇAR

Considerada a capital europeia das start-ups, Berlim atrai milhares de jovens licenciados que não raras vezes conseguem trabalho em empresas – start-ups ou não - com relativa instabilidade. E em Berlim também se pode ficar sem emprego de um momento para o outro. Não faltam ofertas de emprego nas mais diversas áreas e é relativamente fácil recomeçar, mas há também muita concorrência: jovens de todo o mundo, qualificados e com conhecimento de várias línguas. Carolina é perentória: “Pode haver mais volatilidade, mas também há mais oportunidades para pessoas em início de carreira, pode experimentar-se mais e aprender muito em diversas áreas”.

 

No verão de 2016, a empresa onde trabalhava fechou alguns mercados onde operava e Carolina ficou sem emprego. “Procurei novo trabalho ativamente durante dois meses, tive várias entrevistas e um par de ofertas, mas a mais aliciante, a todas os níveis, foi esta. Um ano e meio depois, não podia estar mais satisfeita com a minha decisão”, conta. Trabalha em Marketing na foodora desde novembro desse ano. “Na minha área original de formação, a comunicação, é consideravelmente mais difícil encontrar trabalho sem fluência em alemão. Mas ainda há muita oferta para quem fala inglês em Marketing Digital“, remata. Voltará um dia a trabalhar em comunicação? “Penso nisso, sim, mas talvez mais tarde, num eventual regresso a Portugal”.

 

Já João, viu a empresa de videojogos na qual trabalhava passar por uma fase de restruturação em 2017 e despediu-se. Novamente à procura de emprego, lembra “Fiz as minhas próprias pesquisas de emprego, não apenas em Berlim, mas tive também várias empresas a contactar-me. As únicas seguranças que tive foram as minhas poupanças e a ajuda do Estado”. Poucos meses depois, estava a trabalhar na Toadman Interactive. De menor dimensão que a anterior, a empresa encontra-se atualmente em expansão. João mantém os pés assentes na terra quanto ao crescimento da empresa e ao seu futuro profissional “Tenho plena consciência que, especialmente na minha área, estão sempre a despedir pessoas, mesmo na Alemanha. No mercado dos jogos, é muito difícil ter sucesso – há muitos layoffs ou divisões a serem fechadas. Não tenho garantias, mas também não tenho preocupação”.

 

Tendo deixado a comunicação em stand-by, Carolina ganha agora experiência profissional numa nova área e mantém-se flexível quanto a oportunidades futuras. Com os pés bem assentes na terra, João desdramatiza possíveis percalços de carreira. Afinal, recomeçar faz parte do percurso – profissional e pessoal – e é mais uma oportunidade para aprender e continuar a evoluir.

 

Este artigo foi escrito em parceria com o Goethe-Institut de Lisboa encontra-se publicado na rubrica "Era uma vez...a crise" da revista cultural online do instituto. 

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